top of page
Buscar

Mortes por suicídio e complexidade da vida

Um equívoco frequente de quando se trata de morte por suicídio é associá-la diretamente a um diagnóstico de transtorno mental e, mais comumente, à depressão. O problema dessa leitura é que a resposta fica constrita nos mesmos termos da leitura da questão: se abordar a questão a partir de uma epistemologia da psiquiatria a resposta será medicação e, quando muito, terapia. É a velha simplificação, descontextualização e objetificação de existências em um tecido social em torno de algo denominado por uma disciplina, a psiquiatria, como doença.


As leituras um pouco mais abrangentes apontam as condições econômicas e de vulnerabilidade, por exemplo, como possíveis elementos correlatos. Aqui, outros fatores entram em jogos, mas de modo secundário ou como influenciadores.


No limite, a partir dessas leituras não se produz saúde mental. Nega-se o sujeito em sua complexidade, história, subjetividade e em sua profunda relação com contexto social, que é locus de trocas, intercâmbios e negociações de afetos, mensagens e bens. E tratar apenas como correlatos ou secundários o contexto econômico e social faz com que se retire a centralidade desse contexto e com que a resposta para as desigualdades econômicas e sociais também sejam secundárias.


Com isso, produzem-se entendimentos que, por querer ou sem querer, reforçam o poder da velha psiquiatria. E como as respostas que a gente produz produzem, por sua vez, novas demandas, o resultado disso é o aumento do número de pessoas que tomam medicações. Nada se resolve.


Vale lembrar: quando falamos da necessidade de relações éticas e que cuidam em um tecido social não se trata apenas de dinâmicas afetivas da relação, mas de fato de abrir espaços de negociação na relação. É principalmente sobre dinâmicas de poder contratual em um contexto social e como se coloca o poder contratual em jogo para ampliar o poder do outro. É sobre transformar os lugares sociais e as redes de negociação no tecido social. E isso passa, também, por transformar as condições concretas e materiais de existência nas cidades.


As pessoas precisam ser escutadas e precisam de trabalho e renda. As pessoas precisam ter ampliado seu valor social e precisam de um teto para morar. As pessoas precisam estar inseridas em redes de relação e precisam de condições de viver a vida nos cenários comuns de uma cidade.


Políticas de prevenção ao suicídio precisam abordar a complexidade da vida comum em um território.

 
 
 

Posts recentes

Ver tudo
Golpistas são loucos?

Essas pessoas que estão nas ruas e nos quartéis são doidas? Vamos lá, me acompanha (na mesma linguagem que está sendo utilizada para não...

 
 
 

Comments


Saúde Mental Global
Estudos e Pesquisas em Saúde Mental, Drogas e Desinstitucionalização 

Terapia Ocupacional - FMUSP
R. Cipotânea, 51

Cidade Universitária

São Paulo - SP, 05360-160

claudia.braga@usp.br

© 2024 by Karina Nishioka. Powered and secured by Wix

bottom of page